O Serviço Social tem na questão social a base de sua fundação como especialização do trabalho. Questão social apreendida como o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte da sociedade. A globalização da produção e dos mercados não deixa dúvidas sobre esse aspecto: hoje é possível ter acesso a produtos de várias partes do mundo, cujos componentes são fabricados em países distintos, o que patenteia ser a produção fruto do um trabalho cada vez mais coletivo, contrastando com a desigual distribuição da riqueza entre grupos e classes socais nos países, o que sofre a decisiva interferência da ação do Estado e dos governos.
Essa contradição fundamental da sociedade capitalista – entre o trabalho coletivo e a apropriação privada da atividade, das condições e frutos do trabalho – está na origem do fato de que o desenvolvimento nesta sociedade redunda, de um lado, em uma enorme possibilidade de o homem ter acesso à natureza, à cultura, à ciência, enfim, desenvolver as forças produtivas do trabalho social; porém de outro lado e na sua contraface, faz crescer a distância entre a concentração/acumulação de capital e a produção crescente da miséria, da pauperização que atinge a maioria da população nos vários países, inclusive naqueles considerados “primeiro mundo”.
Os assistentes sociais trabalham com a questão social nas mais variadas expressões cotidianas, tais como os indivíduos as experimentam no trabalho, na família, na área habitacional, na saúde, na assistência social pública, etc. Questão social que, sendo desigualdade é também rebeldia, por envolver sujeitos que vivenciam as desigualdades e a ela resistem e se opõem. É nesta tensão entre produção da desigualdade e produção da rebeldia e da resistência, que trabalham os assistentes socais, situados nesse terreno movidos por interesses sociais distintos, aos quais não é possível abstrair ou deles fugir porque tecem a vida em sociedade. Exatamente por isso, decifrar as novas mediações por meio das quais se expressa a questão social hoje, é de fundamental importância para o Serviço Social em uma dupla perspectiva: para que se possa apreender as várias expressões que assumem, na atualidade, as desigualdades sociais – sua produção e reprodução ampliada – quanto projetar e forjar formas de resistência e de defesa da vida. Formas de resistência já presentes, por vezes de forma parcialmente ocultas, no cotidiano dos segmentos majoritários da população que dependem do trabalho para sua sobrevivência. Assim, apreender a questão social é também captar as múltiplas formas de pressão social, de intervenção e de re-invenção da vida construídas no cotidiano, pois é no presente que estão sendo recriadas formas novas de viver, que apontam um futuro que está sendo germinado.
Esse texto foi extraído do livro Iamamoto,Marilda Villela – O Serviço Social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional, pag.27 ,18 Ed. São Paulo, Cortez, 2009.
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